O Estado no Banco dos Réus: O Abismo da Dependência Química e a Corrupção Sistêmica 

O Estado no Banco dos Réus: O Abismo da Dependência Química e a Corrupção Sistêmica 

​Por: Ginildete Manaia

​Falar sobre a saúde mental e a dependência química de pessoas em situação de rua é um dos maiores desafios da nossa sociedade. Não apenas pela complexidade do tema, mas porque somos forçados a encarar a parcela de culpa que o Estado carrega diante dessa tragédia humana. Ao analisar o cenário atual, percebo que as políticas públicas voltadas para esse público são ineficazes e incapazes de abarcar a dimensão caótica e terrível em que vivem milhares de cidadãos.

​A Trilha para o "Buraco Negro" 

​Entendo que ninguém escolhe a sarjeta por prazer. Muitas pessoas são empurradas para esse "submundo" por uma ponte feita de vulnerabilidade: problemas psíquicos, desequilíbrios emocionais, crises financeiras ou rupturas familiares. Para mim, a saúde mental abalada é o gatilho que lança o indivíduo em uma rota de autodestruição. As drogas agem como um ácido que dilacera não apenas a vida externa do sujeito, mas a sua essência e os vínculos com todos ao seu redor.

​Nesse estágio, a pessoa entra em um colapso psicológico onde o controle da realidade desaparece. O dependente vive anestesiado pelo desespero; ele já não reconhece o perigo, o frio ou a dor. Para quem vê de fora, pode parecer falta de vontade, mas para quem está lá dentro, a droga se torna uma necessidade biológica tão urgente quanto a água ou a comida. É um sequestro da consciência.

​A Necropolítica e a Corrupção do Poder 

​A minha crítica mais contundente recai sobre o que chamo de corrupção sistêmica. Existe uma troca de interesses nas esferas de poder que lucra com a desgraça alheia. É mais fácil e "lucrativo" para o sistema tratar o dependente químico como um objeto descartável. Quando ele perde o controle sobre si, torna-se a mão de obra mais barata do crime: trabalha de graça, serve aos interesses do tráfico e da prostituição e, quando não serve mais, é simplesmente jogado em uma vala.

​O Estado brasileiro, em muitos momentos, prefere a barbárie à cura. É o que vemos em episódios como a chacina no Rio de Janeiro e em tantas outras intervenções violentas. A lógica é perversa: é mais fácil matar do que tratar; é mais barato excluir do que oferecer uma oportunidade real de ressocialização. Matar é a "solução" de um governo que se nega a investir na reestruturação do sujeito.

​A Urgência de uma Virada de Chave 

​Acredito que a reabilitação e a ressocialização devem ser pautadas com seriedade e humanismo, transformando-se em prioridade absoluta do Estado. Não podemos aceitar que a falta de emprego e de estudo continue sendo o combustível para ceifar vidas. Precisamos de um olhar apurado que enxergue o ser humano por trás do vício.

​Este cenário é o reflexo de uma falência múltipla — governamental, social e econômica — que precisa ser discutida por toda a população. Talvez uma mudança drástica de postura, como vimos em outros lugares do mundo (a exemplo do Nepal), seja o que precisamos para quebrar esse ciclo de violência e abandono. Enquanto o Estado se omitir e a corrupção ditar as regras, continuaremos assistindo ao massacre silencioso daqueles que a sociedade escolheu invisibilizar.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

NAVEGANDO NO ESPECTRO

Oficina sobre os direitos humanos e a visão da juventude sobre o seu papel perante a sociedade.